Basquete Brasil
Discute a atualidade da modalidade no Brasil, e suas implicações a um possível soerguimento técnico.
19 março 2008
ARTIGO 400 - UM PREITO AOS QUE MERECEM...
Na semana passada recebi um régio presente com o envio de Portugal da única cópia existente do documentário que fiz sobre o Campeonato Mundial Feminino de 1971 em São Paulo, com sedes em Brasília e Niterói. Foi um filme em 16mm co-patrocinado pela ENEFD/UB (atual EEFD/UB), e a CBB. Filmei, editei, editorei e narrei-o numa aventura impensável nos dias de hoje. Mas foi feito e correu mundo, até que seus originais foram se deteriorando num canto de um lugar qualquer. Encontrei-os e corri para um laboratório profissional na tentativa de salvá-los. O orçamento foi de 6,500 reais em 2002, e por conta dessa quantia vultosa para meus padrões pedi ajuda da EEFD e da CBB, não encontrando disponibilidade financeira na primeira, e qualquer receptividade na segunda. Deixei os originais no laboratório e praticamente desisti de salvá-los. Com a copia recebida, voltei no laboratório e encomendei uma telecinagem pelo bom estado da mesma, e terei salvo o único documentário de técnica de basquetebol até hoje realizado no país. Soube que os originais foram enviados para a cinemateca do MAM, onde irei para a semana tentar, mais uma vez, salvar a obra.
Mas porque esse assunto no quadragésimo centésimo artigo desse pequeno blog? Por que não uma abordagem em assuntos atuais e palpitantes, tão ao gosto da jovem turma que pensa que o basquetebol nasceu a partir do momento em que se interessaram pelo mesmo, desconhecendo suas bases, seu passado e suas conquistas? Assim como a história de um filme guardião de uma época, outros aspectos evolutivos, que se perderam no espectro da memória nacional, hábito mantido pela incultura de nosso povo, devem ser lembrados, como um alerta ao perigo mortal representado pela negação do passado, alicerce do presente, e facilitador das conquistas futuras. E para tal, recordo um momento em que liderávamos as grandes conquistas técnicas, não só dentro das quadras, mas principalmente fora delas, através o magnífico trabalho de uma plêiade de dirigentes e técnicos, capazes de antecederem cronologicamente países que hoje dominam a cena do grande jogo, na formulação de associações de técnicos, que encontrou em nosso país a liderança somente contestada pelos técnicos americanos, com sua obra de arte criada em 1927, a NABC, Associação Nacional de Técnicos de Basquetebol. Os países europeus somente iniciaram a criação de suas associações em 1973, com os espanhóis, dois anos após a criação da ANATEBA, Associação Nacional de Técnica de Basquetebol, nossa associação tupiniquim, e da qual fui o idealizador com honra e humildade, e que foi brilhante e inovadora, a qual presto minhas homenagens nesse artigo de número 400, reproduzindo o Editorial de seu primeiro Boletim, assinado pelo técnico Antenor Horta, seu primeiro presidente, e que deveria servir de exemplo aos técnicos hodiernos, tão caprichosos e sensíveis em suas redomas intocáveis e omissas.
A foto mostra a comissão designada para estabelecer o ante projeto de estatutos da ANATEBA, reunida na Água Branca em São Paulo junho de 1971, constituída pelos técnicos Helio Demoner(ES), Rodnei Alfredique(RJ), Manoel Alibrando(GB), Emilio Karam(MG), Geraldo da Conceição(DF) e Paulo Murilo(GB).
Editorial – Junho de 1971
Foi das mais felizes a idéia do Almirante Paulo Meira, presidente da CBB de fazer realizar, paralelamente ao VI Campeonato Mundial Feminino, o I Curso Internacional de Atualização de Conhecimentos Técnicos e de Arbitragens. Através do setor técnico à frente o esportista Alberto Curi, a Confederação convidou técnicos e árbitros de todas as suas filiadas. E lá estiveram reunidos estudiosos de quase todos os Estados do Brasil, do Ceará ao Rio Grande do Sul, mais de duzentos.
Coube-nos a honra de, ao lado dos Professores Moacir Daiuto e Nilton Agra, dirigir e orientar os trabalhos. Convidamos cada dia, de 19 a 28, um técnico ou árbitro para proferir uma palestra sobre determinado tema, seguido de perguntas e debates.
Para se ter uma idéia da importância dos cursos, basta citar que lá estiveram, neste intercâmbio de conhecimentos e experiências entre outros, proferindo palestras, os técnicos da União Soviética, Tcheco-Eslováquia, Japão e Brasil na pessoa do Professor Raimundo Nonato Azevedo; os árbitros do Uruguai, Argentina e Cuba, mais os brasileiros Renato Righeto e Emídio Mesquita.
A sessão de encerramento foi prestigiada com a presença do Presidente de Honra da FIBA, o brasileiro Antonio dos Reis Carneiro, e todo o escalão da entidade máxima mundial. Todos ficaram impressionados ao ver com que seriedade se cuida no Brasil das coisas do basquetebol.
Nesta sessão foi criada a Associação Nacional de Técnica de Basquetebol, por mais de cem associados fundadores. Fomos distinguidos para a primeira presidência e eleitos ainda, vice-presidente, Professor Moacir Daiuto, de São Paulo, 1º secretário, Professor Paulo Murilo Iracema, da Guanabara, 2º secretário, Professor Luis Afonso, de Minas Gerais, tesoureiro, o Sr.Jack da Silva Fontenelle, da Guanabara, e como Diretor de Divulgação o Sr. Luis Manzolillo, da Guanabara. Esta entidade está aberta a técnicos, professores, árbitros, jornalistas, jogadores e aficionados do basquete.
Visa divulgar o basquete em termos populares , promover edição de boletins e revistas especializadas, promover o intercâmbio de conhecimentos, etc.
Entidade que já nasceu “quente” e atuante, faz circular hoje, 15 dias depois de fundada o seu primeiro Boletim. Outros virão mensalmente.
Conclamamos nossos representantes nos Estados, assim como todos aqueles que amam o Basquetebol, que nos enviem sempre sua colaboração através de trabalhos, observações, estatísticas, notícias, etc.
É importante que cada representante envie mensalmente à Associação um resumo das atividades acontecidas nos seus respectivos redutos. É necessário que novos associados sejam trazidos ao seio de nossa sociedade, cujo objetivo é o de, em plena harmonia com a CBB e suas filiadas, trabalhar, para que o Basquetebol continue louvando sua tradição de 2º esporte no Brasil.
Colaborem com suas idéias e sugestões, participem da vida da agremiação de forma atuante. Dêm algo de si para ela, a fim de que atinja os objetivos a que se propõe e alcance o nível de suas co-irmãs já existentes em vários países como os Estados Unidos principalmente.
Não deixem que só a Diretoria seja o barco confiado. Vamos cada um dar uma remada, a fim de que ela vença sua trajetória com velocidade e segurança para o engrandecimento, e para o aprimoramento moral da nossa juventude, a qual constitue, para nós educadores ou aficionados da educação pelo esporte, a razão de nossas próprias vidas.Antenor Horta .
A Associação durou até 1973, quando a mudança de comando na CBB determinou a retirada de apoio logístico à mesma, motivado pela beligerância deflagrada com o lançamento e organização do mini-basquete no país, no exato momento que os técnicos ganhavam força política e participação decisória.
Hoje, os problemas se avolumaram, saíram do controle, e impera o centralismo e o espectro coercitivo de uma casta de pseudo-desportistas, totalmente voltados aos interesses pessoais e econômicos, desdenhando perenemente daqueles verdadeiros esportistas que fiz recordar hoje no quadragésimo centésimo artigo.
Essa é minha homenagem a todos eles.
Amém.
2 Comments:
Caro Professor Paulo,
triste é o povo que não guarda sua história e não faz questão de lembra-la, estuda-la e reverencia-la!
Um abração,
Henrique Lima
Prezado Henrique,mais triste ainda seria se o esquecimento fosse definitivo,final.Exatamente por isso,é que enquanto vida tiver manterei viva a memória do grande jogo entre nós,torcendo ardentemente que outros mais se juntem a mim,na certeza de que nenhuma conquista técnica ou tecnológica,por mais atual que seja,em nada representará de realmente prático sem o embasamento do passado, fator exequibilizador de toda tentativa de progresso humano.Um abraço,Paulo Murilo.
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